VOLTA POR CIMA
Gislaine (de blusa preta) teve um AVC aos 29 anos. Célia, aos 23. Amanda, aos 27. Fernanda, aos 31. Jovens e ativas, elas foram imobilizadas por um derrame. E voltaram
Fernanda tomava pílula anticoncepcional desde os 16 anos. Além disso, tinha crises frequentes de enxaqueca. Três vezes mais comum em mulheres, a enxaqueca aumenta o risco de derrame. Assim como a pílula. Na véspera do AVC, estava com dor de cabeça. Fernanda é funcionária de uma multinacional que fabrica lanternas e faróis para a indústria automobilística nacional e vivia um período de forte pressão. Tomou um analgésico e foi dormir. De manhã, continuava com dor. Enquanto se trocava para ir trabalhar, despencou no quarto. Sofreu um AVC extenso na região do lobo temporal direito. Os médicos precisaram submetê-la a uma cirurgia delicada. Uma parte da calota craniana foi retirada para que o cérebro tivesse espaço para inchar. Se isso não fosse feito, o edema cerebral aumentaria a pressão intracraniana e Fernanda morreria. Só depois de dois meses, a calota craniana foi recolocada. “Diante da gravidade do caso, a recuperação de Fernanda foi maravilhosa”, diz o neurologista Marcelo Annes, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.
Fernanda faz parte de um grupo pouco conhecido de vítimas do AVC: o das mulheres jovens. Nos últimos cinco anos, 32 mil mulheres de 20 a 44 anos foram internadas nos hospitais do SUS por causa de AVC. Entre os homens da mesma faixa etária, houve 28 mil internações por AVC. A diferença é de 14%. Em todos os outros grupos etários (até os 19 e depois dos 50 anos), mais homens receberam tratamento. A partir dos 80 anos a situação voltou a se inverter. Como as mulheres são mais longevas, houve mais tratamento em pacientes do sexo feminino.
Na verdade, o total de jovens vitimadas pela doença pode ser ainda maior. Não se sabe quantas foram atendidas na rede privada e quantas simplesmente não receberam tratamento. Parte dos casos de AVC na juventude e na meia-idade é explicada pela exposição, cada vez mais precoce, a fatores de risco como hipertensão, colesterol alto, obesidade, diabetes. Isso ocorre em ambos os sexos. Mas existem situações capazes de aumentar o risco de AVC pelas quais só as mulheres passam. Eis as principais.
Uso de pílula anticoncepcional
Na maioria das mulheres, a pílula é segura. Se não fosse assim, todos nós conheceríamos alguma moça que teve um AVC depois de tomar anticoncepcional. Mas as que usam esse tipo de contracepção precisam saber que os hormônios aumentam a capacidade de coagulação do sangue. O mesmo pode ocorrer quando a mulher faz reposição hormonal na menopausa. Quem toma pílula ou faz reposição hormonal está mais sujeita a sofrer de trombose (formação de coágulos no interior de um vaso sanguíneo). E a trombose pode levar ao AVC. Algumas condições genéticas favorecem a ocorrência desse problema. Muitas vezes, porém, o AVC sofrido por uma mulher jovem é o primeiro da família. Foi o caso da engenheira Fernanda. “Em 99% dos casos, as moças não sabem que têm predisposição genética”, diz a neurologista Gisele Sampaio Silva, do Hospital Albert Einstein.
EM CIMA DO SALTO
Anticoncepcional e cigarro
A combinação de pílula e cigarro eleva em oito vezes o risco de AVC. O sangue dos fumantes torna-se mais propenso à formação de coágulos e a nicotina também enrijece as artérias que irrigam o cérebro. Logo, mulheres que fumam não devem tomar pílula. Quantas sabem disso? “Muitas fumam e não contam ao ginecologista”, diz a neurofisiologista Maristela Costa, do Hospital do Coração (Hcor), em São Paulo. O inverso também é verdadeiro. Muitos médicos receitam pílula e não perguntam se a mulher fuma.A gerente de produto Amanda De Tommaso Oliveira, de 31 anos, fumava desde os 15. Aos 27 anos, consumia um maço por dia e não tomava pílula. Para tentar reduzir um cisto no ovário, o ginecologista receitou-lhe um anticoncepcional. Após dez dias de uso, Amanda teve um AVC. Estava em casa, assistindo à TV, quando o braço esquerdo começou a ficar pesado. O desespero aumentou quando Amanda tentou pedir ajuda à irmã Isabela. Os pensamentos fluíam, mas ela era incapaz de pronunciar qualquer palavra.
Amanda sofreu um AVC pequeno na região frontal do cérebro, no lado direito. Passou três dias no hospital. Logo nas primeiras horas, a fala e os movimentos foram voltando. Desde o derrame, nunca mais colocou um cigarro na boca. Hoje leva vida absolutamente normal. Mas a experiência deixou marcas profundas. “O AVC não estava no meu script, mas me ensinou a valorizar cada instante”, diz Amanda. Em vez de pensar naquilo que quer ter, pensa no que já tem. “Tenho casa, família, amigos e pernas que me levam aonde eu quero. Já tenho tudo.”
Gordura abdominal
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